Quando voltei a jogar Magic já adulto, em 2015, comecei a frequentar lojas e a entender os diferentes formatos competitivos. O Modern era de longe o formato mais jogado, mas eu ainda estava me reconectando com o jogo e não queria investir tanto dinheiro em um deck só para começar a jogar.
Por um tempo, montei decks rogue, sempre testando e ajustando, mas com a constante sensação de estar em desvantagem em relação a quem jogava com os decks do meta.
Lembro até hoje do dia em que vi um panfleto anunciando os primeiros torneios de Pauper na loja. Nunca havia ouvido falar do formato, mas me interessei imediatamente. Como já vinha montando um deck de Goblins, decidi correr atrás das cartas comuns, e foi assim que ingressei no Pauper.
Naquela época, o formato não tinha o apelo que possui hoje. Jogar apenas com cartas comuns ainda carregava certo preconceito, e muitos nem consideravam o Pauper um formato competitivo de verdade. Mas o tempo passou, a comunidade cresceu, os torneios se multiplicaram e, hoje, o Pauper é um dos formatos mais populares do Brasil.
E é sobre essas transformações que eu quero conversar com vocês, hoje falaremos sobre a origem e a evolução do Pauper.
Muitos sabem que o Pauper não foi criado oficialmente pela Wizards of the Coast. O formato surgiu em uma época em que os jogadores do Magic Online (MTGO) realizavam torneios independentes na plataforma. Naquele tempo, já existia um formato budget extraoficial chamado Peasant, que permitia até cinco cartas incomuns no deck, sendo todas as outras comuns.
Por volta de 2004~2005, alguns jogadores organizaram um torneio chamado Peasant Deck Challenge (PDC). Porém, com o lançamento do coleção Darksteel, surgiu também a preocupação com o poder de uma das cartas incomuns: Skullclamp . Temendo que ela quebrasse o equilíbrio do Peasant, os organizadores decidiram permitir apenas o uso de cartas comuns. Mais tarde, esse novo formato recebeu o nome de Pauper, e o PDC passou a significar Pauper Deck Challenge.

Somente em dezembro de 2008 a Wizards introduziu o Pauper como um formato jogável do MTGO.
Inicialmente, o apoio da Wizards of the Coast ao Pauper era restrito ao MTGO, ou seja, o formato só existia digitalmente. Apenas cartas que haviam sido impressas como comuns na plataforma eram permitidas, sem qualquer suporte oficial para o jogo físico (tabletop).
Nesse cenário, surgia um grande dilema para quem queria jogar o Pauper tabletop, já que algumas cartas comuns no papel não eram consideradas comuns no MTGO, e o contrário também acontecia. Isso gerava muita confusão entre os jogadores.
Por exemplo, Hymn to Tourach foi impressa como comum em Fallen Empires (1994), mas entrou no MTGO como incomum em 2007. Assim, ela era inválida no Pauper digital, mas válida no Pauper tabletop.


Já
Chainer's Edict
foi impressa originalmente como incomum em Tormento (2002), mas chegou ao MTGO como comum em 2014. Portanto, era válida no Pauper digital, mas inválida no tabletop.


Nesse contexto, os jogadores que desejavam jogar Pauper tabletop precisavam criar suas próprias regras de validação e listas de cartas, o que dificultava a organização de torneios consistentes e padronizados.
A maioria das lojas e grupos que jogavam o formato físico acabava seguindo as regras do MTGO para determinar quais cartas eram válidas ou banidas, mas isso não era uma unanimidade. Em 2014, por exemplo, foi realizada a primeira edição do Nacional Pauper no Brasil, seguindo a lista de banidas do MTGO, mas considerando a legalidade do tabletop, o que permitiu o uso de cartas como Hymn to Tourach e Goblin Grenade no torneio.
Em 2019, o Pauper já era um formato consolidado, tanto no digital quanto no físico. Foi apenas em junho daquele ano que a Wizards of the Coast deu um dos passos mais importantes para o formato, oficializando-o também no tabletop. A partir de então, qualquer carta que tivesse sido impressa como comum — seja em edições físicas ou no MTGO — passou a ser considerada válida.
Essa mudança representou uma conquista importante: finalmente era possível explicar a legalidade das cartas de forma simples e, acima de tudo, jogar o mesmo Pauper em qualquer lugar do mundo.
Mais de dez anos após o surgimento do formato, o Pauper passou oficialmente a figurar entre os formatos listados no site da Wizards of the Coast, com a possibilidade de pesquisar cartas filtrando por “Pauper”, e com lojas autorizadas a organizar torneios selecionando o formato diretamente nos sistemas oficiais da empresa.

Mais recentemente, em 2022, após o Pauper enfrentar diversos desafios causados pelo lançamento de cartas que desequilibraram o formato, como Fall from Favor e Chatterstorm , Gavin Verhey, designer da Wizards of the Coast, anunciou a criação do Pauper Format Panel (PFP). Um grupo formado por jogadores de diferentes partes do mundo, juntamente com representantes da própria Wizards, com o objetivo de analisar o formato, propor banimentos quando necessário e garantir sua saúde e equilíbrio competitivo.
Desde o ínicio, o grupo é composto pelas mesmas sete pessoas: Gavin Verhey (EUA) e seis representantes internacionais reconhecidos pela comunidade:
- Mirco Ciavatta (Itália) – jogador conhecido como Heisen01, bicampeão do Paupergeddon.
- Emma Partlow (Reino Unido) – coapresentadora do podcast The BMCast.
- Ryuji Saito (Japão) – cofundador do site PauperMTG.com e criador de conteúdo.
- Paige Smith (EUA) – colunista da CoolStuffInc.
- Alex Ullman (EUA) – autor do blog Nerd to the Core.
- Alexandre Weber (Brasil) – jogador, criador de conteúdo e tetra campeão do Nacional Pauper Brasil.
O PFP funciona de forma colaborativa, discutindo estado do formato e propondo recomendações oficiais de mudanças para a equipe de Play Design da Wizards, acelerando decisões e trabalhando para manter o formato saudável.
Já se passaram dez anos desde que comecei a jogar Pauper. Quando olho para trás e lembro das dificuldades que era reunir seis jogadores para participar de um torneio, fico realmente feliz em ver o quanto o formato evoluiu e se fortaleceu ao longo do tempo. Hoje, jogar Pauper é mais acessível e, acima de tudo, muito mais recompensador.
Competitivamente, o Pauper está vivendo sua melhor fase no Brasil, com grandes torneios acontecendo.
Em 2024, a Liga Magic retomou o Circuito Liga Magic (CLM), e dese então o Pauper vem sendo um dos grandes protagonistas. Nesta temporada, o formato reuniu um número recorde de jogadores e ofereceu premiações superiores às de outros formatos.
A Mont, uma loja de Campinas, também organizou recentemente um torneio com R$15.000 em premiação e 170 participantes, enquanto o Next Level Pauper Tour deste ano distribuiu R$12.000 e contou com a presença de 146 jogadores.
Além disso, o Nacional Pauper completou 10 anos em 2024 e fez história ao realizar o seu maior evento, com um número recorde de 274 jogadores e uma premiação total de R$18.000.
O que começou pequeno e sem apoio cresceu, conquistou seu espaço e, hoje, podemos dizer com orgulho: o Pauper é um dos pilares do Magic competitivo no Brasil.

